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A Equipa Redactorial

terça-feira, 30 de junho de 2009

ILUSTRES LECEIROS - Amélia Carneiro: Histórias do Rio e Mar de Leça

Com esta conferência pretendeu a Junta de Freguesia de Leça da Palmeira homenagear mais uma pessoa que viveu em Leça da Palmeira durante um período da sua vida retratando através das suas pinturas alguns dos belos recantos desta nossa encantadora terra.
Para tal convidou prof. A. Cunha e Silva que esquematizou a respectiva apresentação começando por desafiar o neófito nestas andanças, Miguel Rocha dos Santos, que se saíu muito bem mostrando que há que dar lugar aos novos para que estas iniciativas tenham continuidade com qualidade, e se não atentem neste texto:
“Apresentar o Amigo Prof. Cunha e Silva é tarefa difícil. Outros de maior valia e gabarito já o fizeram, por isso vi-me obrigado a pedir ajuda. Uns dias antes de ser convidado a apresentá-lo, tinha lido um conto do autor americano Howard P. Lovecraft que, a certa altura, me fez pensar nele. Atentem então neste excerto.
“ Não há muitas pessoas que saibam das maravilhas que aguardam para serem reveladas através do recordar das histórias e das visões das suas próprias infâncias. Enquanto crianças nós escutamos, sonhamos e guardamos pensamentos incompletos que, quando mais tarde queremos recordar, já nos achamos prosaicos e (…) sob o efeito (…) da vida. Mas alguns de nós acordamos durante a noite com estranhas aparições de colinas e jardins encantados, de fontes cantando ao sol, de penhascos dourados sobre mares murmurantes, de planícies que se estendem até às cidades adormecidas de bronze e pedra e de fantásticas companhias de heróis em neblina, galopando em adornados cavalos brancos ao longo das orlas de densas florestas, e nesse momento apercebemo-nos de que olhávamos através de portões de marfim para aquele mundo de encantamento que era nosso antes de sermos sábios (…)”
Ora, se o Amigo Cunha e Silva me permite a ousadia, eu penso que ele é sábio precisamente porque não deixou de ver através desses portões de marfim e parece até cruzalos de vez em quando, aliando esta espantosa capacidade à sua vasta experiência de vida.
Na verdade, creio que os seus feitos nas mais diversas áreas, como a música, a pintura, a literatura e em geral a cultura da nossa comunidade, são fruto do trabalho não de um Prof. Cunha e Silva, mas pelo menos três (que eu tenha identificado…). Acompanhem-me, por favor, neste devaneio, enquanto aplico esta teoria a momentos específicos de estudo que o Prof. realizou para nos dar a conhecer a pintora naturalista que passou por Leça da Palmeira, Maria Amélia de Magalhães Carneiro:
- Certo dia, Prof. Cunha e Silva físico, a três dimensões, percorreu a Rua Dr. Augusto Cardia Pires, onde morava a minha avó Brízida, para visitar a casa de Amélia Carneiro habitou temporariamente. Acompanhando-o, seguia o Cunha e Silva intelectual, mas na quarta dimensão, o tempo, percorrendo a mesma rua na época em que ainda se chamava Rua Central, em busca de elementos que lhe permitissem descobrir como vivia a pintora. Ambos no mesmo local, a trabalhar para o mesmo objectivo, mas em tempos diferentes;
- Numa outra ocasião, ía o Prof. Cunha e Silva físico de comboio, a ler, enquanto o Cunha e Silva intelectual vogava por entre informações, tentando dar-lhes ordem, procurando a melhor forma de as expor quando, de repente, um Cunha e Silva metafísico, o que está ligado às energias criativas, desperta a atenção dos outros dois para uma curiosa frase que iria ajuda-lo (s) a olhar claramente o seu objectivo, através de um prisma realmente singular. Pasmem-se com a analogia que o nosso Amigo nos irá apresentar, mas que não revelo agora, para não estragar a surpresa!
É destas estritas colaborações que nascem fascinantes comunicações. O Cunha e Silva que temos hoje connosco é a integração destes três num só plano de existência, com a força e a imaginação para nos maravilhar com as suas descobertas.
No entanto, não é essa a sua única força. Hão-de reparar na sua expressão, a alegria e o entusiasmo com que fala dos temas a que se propõe. Também daí parte o encanto de o escutar.
Pode então afirmar-se que ele tem gosto em viajar pelas histórias que conta, mas maior gosto em levar outros de viagem consigo. Com certeza já todos viram um bando de aves voando em formação, na qual uma delas, agindo como navegador, segue um pouco mais à frente. Assim é o Prof. Cunha e Silva, com uma ressalva, uma particularidade sua. É que, quando se apercebe que um dos membros do seu bando tem algo de valor a acrescentar, uma história para contar, uma pintura para partilhar, um caminho novo a percorrer, uma terra desconhecida a desbravar, ele alegremente lhe cede o lugar de navegador. Ele ergue-se, e com ele os inspirados de Leça da Palmeira. E nisto reside a profunda e inequívoca verdade acerca deste nosso Amigo. O intenso desejo de dar a conhecer! Não importa como, desde que se prime pela qualidade.
Em jeito de conclusão, e porque já devem estar ansiosos por o ouvir, regresso ao conto com que iniciei esta intervenção, com uma pequena adaptação:
O Prof. Cunha e Silva “(…) [busca] apenas a beleza da vida. Quando a verdade e a experiência já não [têm] força para revelá-la, ele [procura-a] na fantasia e na ilusão, conseguindo encontrá-la na soleira da sua própria porta, entre as nebulosas memórias dos contos e dos sonhos de infância.”
Escutemo-lo…”
Então escutamos o prof. Cunha e Silva explicando vários trabalhos da autoria da homenageada e outros que considerou relevantes para nos explicar o percurso da pintora.
Maria Amélia de Magalhães Carneiro, nasceu em 2 de Março de 1883, na freguesia de Cedofeita, no Porto. Era filha de José Bernardo Dias Carneiro e de Júlia Caldas Moreira Magalhães Carneiro, era irmã de um dos mais prestigiados Presidentes da Câmara Municipal de Matosinhos, o Comendador José Magalhães Carneiro, e prima de António Carneiro. Iniciou-se na Academia de Belas Artes do Porto, tendo prosseguido estudos com o Mestre Júlio Costa. Em 1940 decidiu vir viver para Leça da Palmeira, para casa de sua irmã Maria Helena, casada com Norberto de Moura e Melo de Zagalo Ilharco, que vivia numa casa da Rua Dr. A. Cardia Pires (antiga Rua Central), contigua àquela em que nascemos. Faleceu na casa de uma outra irmã, situada na Rua de Brito Capelo, em Matosinhos, em 1970, com 77 anos de idade, deixando um precioso e maravilhoso legado.

Eng.º Rocha dos Santos in "A Voz de Leça" Ano LVI - Número 4 - Junho de 2009